quinta-feira, 16 de junho de 2011

A Odisseia do vereador

Desenho de Carlos Magno.
Conta a Odisseia de Homero que Ulisses, herói grego na Guerra de Troia, enfrentou inúmeros perigos ao retornar para Ítaca, sua terra natal, após o conflito com os troianos. Na viagem de volta, que durou dez anos, ele desafiou a ira dos deuses do Olimpo e encarou personagens abomináveis como um monstro marinho de várias cabeças (Cila), sereias traiçoeiras e o ciclope Polifemo. Nenhuma dessas criaturas, porém, chega a ser tão assustadora quanto às intempéries políticas pelas quais deve passar quem pretende se candidatar a prefeito de Grossos.

O caminho que leva ao poder na cidade é tortuoso e repleto de adversidades assim como a epopéia grega. No entanto, isto não tem desencorajado os pretendentes ao cargo mais cobiçado do município. Muito pelo contrário. A lista daqueles que querem chegar ao topo do Executivo local só tem aumentado. E o mais novo participante dessa aventura é o vereador Cateca.


Timoneiro da nau comunista, o edil terá que ajustar seu discurso antes de lançar-se ao mar agitado da sucessão grossense. Vale lembrar que não é a primeira vez que tal mudança acontece. Quando ainda não fazia parte de nenhum grupo político da cidade, Cateca ostentava uma retórica combativa, sendo implacável com seus adversários. Deles exigia sobretudo a transparência no trato da coisa pública. Agora, os princípios que defende continuam os mesmos, mas a disposição em lutar por eles arrefeceu diante do aconchego governista.

A brandura de suas palavras ou a omissão delas é resultado da fidelidade ao prefeito seguida à risca. Essa postura tem ofuscado a autonomia e independência do mandato da principal estrela do PC do B na cidade. Resta saber se o vereador permanecerá tão solidário com a gestão pessebista a ponto de levar para sua nova empreitada a rejeição do governo. Se decidir não carregar esse fardo político, pode tentar emplacar uma espécie de terceira via, correndo sério risco de sucumbir em meio ao fogo cruzado entre a oposição e situação.

Superada essa fase da elaboração do discurso, que corresponde a escolha das coordenadas corretas para se navegar, o pŕoximo passo é checar a confiança da tripulação. A medida visa confirmar a determinação dos apoiadores em resistir aos desafios da árdua jornada rumo à Prefeitura. Além disso, é bom ficar atento pois sempre há um ou outro marinheiro que não vê a hora de chegar em terra firme para tomar as rédeas do poder. Por isso, qualquer falha nesse processo de seleção implica sérios problemas a serem sanados no futuro.

Mas só lealdade dos seus seguidores e uma boa orientação não bastam para o sucesso dessa saga. É preciso também ter cuidado com alguns atalhos, rotas mais fáceis de se chegar ao mesmo destino que têm um custo político muito alto. Os caminhos mais curtos são parte integrante do plano dos semideuses grossenses para continuarem o seu reinado na cidade. Eles oferecem facilidades em troca da manipulação daqueles que ocupam a cadeira de prefeito. É a fúria disfarçada do Olimpo refletida sob a forma monstruosa do poder econômico. Este costuma expor a vulnerabilidade de caráter dos que se sujeitam à sua sedução, corrompendo autoridades e transformando governos promissores em medíocres.

E para não cair na mesma cilada preparada há mais de 50 anos pelos que se acham donos de Grossos, o parlamentar deve seguir o exemplo de Ulisses. Em uma das mais importantes passagens do poema épico, o guerreiro lendário foi tentado pela Ninfa Calipso que, em troca de sua companhia lhe ofereceu a eternidade. O herói rejeitou a proposta. Queria sim alcançar um sonho, mas não ao custo de perder virtudes que certamente não tem preço.

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