quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Pelas ruas de Oberã

Por Genildo Costa.*

Quando tomei nota de minhas poucas lembranças dei conta de que não estava mais comigo as mesmas criaturas, as mesmas impressões digitais tatuadas no meu corpo franzino de menino moleque.

Pelo prado de meus encantamentos a certeza de sempre encontrá-lo. Altivo e sereno. Reticente. Exposto às agruras desses mesmos dias de leviana submissão que tenho que suportar...a contra gosto. Mesmo assim, continuo insistindo em refazer a mesma moldura que antes me permitia ser bandido e, muitas vezes, herói desses tempos de vida brejeira e de liberdade provinciana.

Para além de nossas limitações, a configuração de uma outra estampa que não encontro jamais, pois não sei se já é hora de confessar o tamanho de minha agonia. Acredito não ser oportuno destilar dores quando tudo não passa de algo pertinente a essa tal subjetividade humana. Agora sim, percebo que todas as sombras se dissipam. Seguem rumo ignorado. Algumas tropeçam no último degrau da escadaria e não encontram equilíbrio para continuar seguindo por essas ruas de sentimento amiúde.


Imagino às vezes que fracassei quando o tempo ainda não me havia credenciado o mínimo de maturidade para viver a totalidade de minhas aspirações. Mas mesmo assim, confesso que vivi intensamente o trágico e o mais belo espetáculo desses dias de confinamento e depuração de Oberã.

Aconteço quando posso por pura necessidade. Acerto o passo e de vez em quando sei que as vitrines são as mesmas que outrora pude contemplar. Sem rara beleza. Sórdida. Estática. Expõe-se e a si mesmo ridiculariza-se. São os mesmos gestos que até então me incomodam. Perpetuam-se. E sempre que podem se revestem  de pouca sensatez e se autoproclamam super-heróis numa constelação de estrelas miúdas, que dificilmente se pode alcançar por esses horizontes de tão visível desumanidade.

Por mais que seja fugaz essa temporalidade de semideuses que me atormenta, sigo, mesmos às tontas, sem reclamar, atalhos para não trilhar os mesmos caminhos dessas ruas sinuosas de Oberã. Vivos traços desses espectros de homens vis. Alguns reticentes, outros lobos famintos, que divagam na sua inquietude como quem perdeu a noção de se olhar no espelho de sua própria identidade.

Desses tão fatídicos dias, reservo a mim não mais que uma simples carta de recomendação. Hoje sonata velha de minhas cicatrizes. Páginas esquecidas que poucas vezes me vi folheando. Aos que virão, penso que por essas esquinas, não encontrarão nenhuma claridade que possa nos salvar definitivamente. Tenho pressa e não mais consigo volver o olhar, pois tão próximo de nossa chama, os últimos gritos silenciam-se. Calam-se para nunca mais se tornar fragmentos desse cotidiano de absoluta depuração de palavras suicidas.

*Genildo Costa é cantor e compositor.

Nenhum comentário: