quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Nós somos alteridade

Por Túlio Madson* via Carta Potiguar.

Nós nos tornamos aquilo que contemplamos. É pela contemplação do mundo e dos outros que nos fazemos. O que somos é algo constantemente modificado pelos outros.
 
Nem mesmo para nós somos o mesmo, assumimos inúmeras personalidades, como no filme “O médico e o monstro” baseado na obra de Robert L. Stevenson, não conseguimos lidar com o fato de que somos apenas um, enquanto tantos coexistem dentro de nós.
 
E assim, nesse embate de modos de ser divergentes nunca permanecemos o mesmo, nunca temos unidade naquilo que somos, somos sempre de um modo em uma tal ocasião, em um tal ambiente, com uma tal pessoa.  Somos sempre diferentes do que fomos a pouco e seremos sempre diferentes do que somos agora. Nossa única constância é o devir. 
 
Nem mesmo uma unidade biológica há: nosso corpo é uma cooperativa de organismos vivos,  e como tais, morrem, se reproduzem e interagem com o meio e com as substâncias disponíveis. Sendo assim, nosso corpo nunca permanece o mesmo. 
 
Não apenas a fisiologia, mas a memória também é mutável, ela se molda às novas informações, adicionando e excluindo novos registros. Logo, não há uma lembrança igual à outra em períodos de tempo diferentes. A forma como guardamos informações em nosso cérebro é imprecisa e mutável, não possui a precisão estática da nossa linguagem. De modo que não apenas o que sou é mutável, mas também o que fui, uma vez que aquilo que fui existe exclusivamente em registros que são continuamente modificados em nossa mente.

Não apenas nossas memórias são mutáveis, mas também nosso conhecimento. Todos os campos do saber – história, arte, ciência, filosofia, religião – são constantemente reescritos, reavaliados, refundados.
Assim, talvez, só possamos nos definir de um único modo : Nós somos alteridade.
 
* Túlio Madson é bacharel e mestrando em Filosofia pela UFRN e colunista da Carta Potiguar, site do qual foi extraído este artigo.

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