quarta-feira, 21 de abril de 2010

Sob a sombra do umbigo

Por Genildo Costa

Quando o espelho não consegue mais reproduzir a nossa imagem para dentro de nós mesmos é sinal de que estamos cada dia menos interessados quanto a vidraça que nos impede de ver o outro lado da rua.

Que não seja necessário saltar o muro do vizinho para entender, de fato, a dor que agoniza e que deixa seqüelas. Que não sejamos tão míopes para com os retardatários, pois sempre existirá tempo de abraçá-los. A cidade acanhada, de vez em quando tropeça, tomba, mas não consegue compreender sequer o bêbado que atrapalha o passeio público.

Todo cuidado é pouco para com os que não alcançam os padrões de normalidade. Não tenha dúvida: do riso mascarado se extrai o conceito ideal desse espectro que assusta e contamina o ambiente.Tudo na absoluta normalidade. Não poderia ser diferente. Passamos a infância inteirinha aprendendo a gostar do trigo e sempre sonhando em comer faisão.

Aprendemos muito pouco a exercitar o abraço sincero porque nessa total ausência de solidariedade fomos surpreendidos com o fim da expressão sensível e poética da alma.

Não há mais novidade por detrás de cada aurora. Somente a certeza de que os dias vindouros trarão consigo a convicção de mais uma outra manhã sombria.

Do arlequim cheiroso, a sensação de que a sua essência possa não transcender os muros dessa eterna vontade minha de não acreditar jamais numa outra possibilidade de aguar outros jardins em flor. Tão frágil é a flor que amanhece sem vaidades. Tão serena é a tua grandeza quando ensaia os primeiros encantos da tua primavera.

Haverá sempre pra cada começo de calendário uma oportunidade para que se inicie uma nova trajetória onde possa nos levar ao encontro de um novo paradigma de produção e consumo, priorizando de maneira justa e solidária as necessidades básicas dos povos, vítimas da ganância e da exploração do homem pelo homem.

O tempo nos espera no dobrar de qualquer esquina mesmo que saibamos quanto é difícil proclamar ao irmão mais próximo o pacto dos homens celebrando efetivamente o princípio de uma nova relação onde a ética na política possa resgatar a noção de coletividade.

Sob os céus do Haiti, não há como evitar as conseqüências de uma tragédia anunciada. A natureza responde à altura e gera o debate planetário em meio aos escombros que só haverão de ser removidos quando os ventos de um novo processo civilizatório soprarem definitivamente, apontando para a constelação de uma nova vida, uma nova morada não mais assentada no lucro e na acumulação do capitalismo selvagem.

Fomos historicamente cooptados para a defesa intransigente de uma mesma retórica onde as condições objetivas de um único modelo de desenvolvimento nos ensinou a conviver lado a lado com um exército de miseráveis adaptados a um contexto de profunda exclusão social.

Que a enganação dos templos nos deixe pelo menos toda certeza de que o imperativo da palavra não seja mais uma ferramenta disponível para se lapidar um outro modelo de concessão fandamentado na vaidade e na soberba humanas.

Para os insensatos e tiranos, a irrevogável sentença. Para os detentores do poder, a convicção plena de que a socialização da riqueza se constitui num gesto de grandeza e de altruísmo.

Estejamos atentos, pois haveremos de nos encontrar. Quem sabe numa outra estação onde a farta colheita possa anunciar o canto novo de uma humanidade menos injusta e mais fraterna.

* Genildo Costa é cantor e compositor e colaborador do jornal PORANDUBA.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Atraso

"Depois 121 anos de República, apenas 25% dos adultos são capazes de ler, entender texto de uma página."

* Nota escrita pelo senador Cristovam Buarque em seu twitter.

domingo, 4 de abril de 2010

Pileque precoce

Por Frei Betto

Pesquisas indicam que o perfil preponderante do jovem brasileiro de hoje é, ao contrário da minha geração, conservador, individualista, distante daqueles que, em meados do século XX, queriam mudar o mundo.

Agora, ele se mostra mais preocupado em ter um bom emprego do que motivações ideológicas; menos propenso a riscos e mais apegado à família. A relação com a sociedade é mais virtual que real: fechado em seu quarto, ele nem precisa rezar "venham todos ao meu reino", pois tudo lhe chega através do telefone, da TV, da internet, do MP3.

A cultura consumista a todos nós oferece, em cálice dourado, o elixir da eterna juventude. Os jovens não querem deixar de ser jovens; adultos e idosos insistem em imitar os jovens. E o principal fator de afirmação é a auto-imagem, a valorização da estética.

O jovem atual não quer se arriscar; anseia por experimentar. Na falta de motivação religiosa, experiência espiritual e ideologia altruísta, tende a buscar na bebida e na droga a alteração de seu estado de consciência. Sem isso não se sente suficientemente relaxado, loquaz, divertido e ousado.

É óbvio que a mídia dita padrões de comportamento, hábitos de consumo e paradigmas ideológicos. A diferença é que tudo isso chega ao jovem de tal forma bem embalado em papel brilhante e fita colorida que ele nem percebe o quanto é vulnerável à ditadura do consumismo.

No Brasil, a ingestão de bebidas alcoólicas é legalmente proibida a menores de 18 anos (nos EUA, 21 anos). A fiscalização pouco funciona e o Estado permite a publicidade de cerveja a qualquer hora em rádio e TV – concessões públicas – e o estímulo ao consumo precoce. Inclusive a utilização publicitária de pessoas famosas das áreas de entretenimento, artes e esportes para suscitar em crianças e jovens reações miméticas de consumo de álcool.

Dados do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid) informam que 42% das crianças brasileiras com idade entre 10 e 12 anos já consumiram bebida alcoólica, e 10% dos jovens de 12 a 17 anos podem ser classificados como dependentes de álcool.

Os adolescentes acreditam que um copo de chope não implica risco à saúde. Talvez. O problema é que, ao se enturmar num bar, ele bebe oito ou dez. Ou apela para o mais barato, no duplo sentido da palavra, custo e efeito: uma garrafa de cachaça ou vodca custa menos que uma rodada de chope e provoca rápido "um barato".

O Ministério da Saúde já calculou quanto o alcoolismo custa aos cofres públicos? Quanto gasta o INSS com os alcoólicos afastados do trabalho por razões de dependência? De que adiantam as campanhas de prevenção se atletas de renome fazem propaganda de bebida alcoólica?

A publicidade de bebida destilada – cachaça, uísque, vodca – obedece à restrição de horários, regulados pela lei 9.294/1996. Entre 6h e 21h é vetada a publicidade de destilados, embora muitas rádios burlem a proibição. A cerveja, que responde por 70% de todo álcool ingerido no Brasil, é livre de regulamentação. E é por ela que muitos jovens ingressam na dependência química.

Pela lei 9.294, bebida alcoólica é a que possui mais de 13 graus na escala Gay-Lussac. O Congresso Nacional assim determinou pressionado pelos produtores de cerveja e vinho. Normas internacionais consideram que é alcoólica toda bebida com 0,5º GL ou acima.

Todas as demais leis do Brasil – de trânsito, fabricação etc. – consideram alcoólica toda bebida com mais de 0,5º GL. A cerveja tem cerca de 4,8º GL. Verifique com lupa o rótulo de uma cerveja dita "sem álcool". Com exceção de uma marca, as demais possuem 0,5º GL, ou seja, fazem, com respaldo da lei, propaganda enganosa. Assim, pais desavisados deixam crianças ingerirem a cerveja "sem álcool" e alcoólicos em tratamento são vítimas do mesmo engodo.

O Código de Auto-regulamentação do Conar (Conselho de Auto-regulamentação Publicitária) alerta que comerciais de cervejas não devem ser atrativos para o público jovem. O que se vê é o contrário. As peças publicitárias exalam jovialidade, bom humor, espírito de tribo, linguagem própria de jovens, sem que haja nenhum controle.

Vêm aí a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Se permanecer liberado o direito de associar desportistas com bebidas alcoólicas, a Lei Seca, com certeza, vai dar água...

Em muitos países, como no Canadá, há regulamentação à publicidade de bebida alcoólica, visando à proteção do público infantil. Lá não se vende bebida alcoólica em supermercados, lojas, padarias e mercearias. Só se permite em bares e restaurantes.

O Free Jazz, festival de música, foi cancelado por ser patrocinado por uma marca de cigarro. O mais badalado camarote do sambódromo exige que se vista a camisa de uma produtora de cerveja. Não existe o alerta: "Se fumar, não dirija". Já no caso da bebida...

O argumento de que regular a publicidade é censura ou fere a liberdade de expressão é mero terrorismo consumista centrado em sobrepor interesses privados ao interesse público, como é o caso da proteção da saúde da população, em especial de nossas crianças e adolescentes.

Frei Betto é escritor e assessor de movimentos sociais. Autor de obras consagradas como "Batismo de Sangue" e "Fidel e a Religião".

sábado, 3 de abril de 2010

Boas vindas


Chegastes, Felipe? Bem-vindo a nova morada

Onde a paz, a harmonia, a esperança
Se confundem com teu riso de criança
Pra que a gente possa assim celebrar tua chegada....

Não tenhas medo, Felipe. Pode chegar! É o teu universo
Repleto de alegria e de muita satisfação
Assim como a sonata dos pardais em festa....
O teu choro de menino saúda os que virão

Ver de perto a mais nova canção que anuncia
Um novo tempo para uma nova melodia
Toda certeza de um jardim em flor....

Já se escuta, Felipe, a tua voz clamando
Como alguém que já nasceu cantando
Os versos simples desse teu C A N T A D O R...

* Por Genildo Costa, cantor e compositor.
** Um poema de gratidão a Felipe Tierra.